domingo, 12 de novembro de 2023

Para que serve o Clavulanato de Potássio (ácido clavulânico)?

Se você é uma pessoa observadora, já deve ter notado que existem medicamentos com apenas amoxicilina, e outros que combinam a amoxicilina com clavulanato de potássio (que é a forma do ácido clavulânico usada pela indústria farmacêutica). 

Mas qual é a sua função?


Para entendermos, precisamos ter uma noção da estrutura química das penicilinas, que são antibióticos do grupo dos betalactâmicos. O nome deste grupo deriva do núcleo (ou anel) betalactâmico, que é uma estrutura molecular comum a todos os antibióticos pertencentes a este grupo.

Núcleo betalactâmico (em vermelho)

A amoxicilina, que é uma penicilina, possui portanto o núcleo betalactâmico em sua molécula:



A ênfase dada até agora ao núcleo betalactâmico se deve ao mecanismo de resistência das bactérias a este tipo de antibióticos. Algumas bactérias produzem enzimas chamadas betalactamases, que se ligam ao anel betalactâmico e provocam sua quebra, inativando assim o antibiótico. A produção dessas enzimas é uma defesa da bactéria, para evitarem ser mortas pelo antibiótico.


Aí é que entra o clavulanato…


O clavulanato também possui um núcleo betalactâmico em sua estrutura:


As betalactamases produzidas pelas bactérias possuem uma afinidade maior pelo anel betalactâmico do clavulanato do que pelo da amoxicilina. Então, essas enzimas se ligam ao clavulanato e ficam presas, deixando a amoxicilina livre para agir. O clavulanato, portanto, se sacrifica para que a amoxicilina “brilhe”!


Em resumo, o clavulanato serve para diminuir a resistência das bactérias contra a amoxicilina, sendo terapeuticamente mais vantajoso do que a utilização da amoxicilina sozinha, porém tem o custo mais elevado como sendo sua desvantagem. 



quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Exposição a uma classe de antidepressivos (ISRS) é associada a redução do volume cerebral na infância


Um estudo publicado no JAMA Psychiatry, em 30/08/2023, examinou a exposição intrauterina a antidepressivos do tipo Inibidores Seletivos de Recaptação de Serotonina (ISRS) e sua associação com o volume cerebral em crianças. O estudo revelou que a exposição pré-natal aos ISRS estava relacionada a uma diminuição no volume cerebral infantil. No entanto, os pesquisadores enfatizaram que as descobertas foram baseadas em um estudo com um tamanho de amostra relativamente pequeno e, portanto, exigem interpretação cuidadosa.

O estudo envolveu 3.198 gestantes e suas crianças e dividiu as participantes em cinco grupos: 41 que usaram ISRS durante a gravidez; 257 mulheres que não usaram ISRS, mas tiveram sintomas depressivos durante a gestação; 77 mulheres que usaram ISRS no pré-natal; 74 que evoluíram com sintomas depressivos após o parto; e 2.749 sem sintomas depressivos ou uso de ISRS, como grupo controle. Entre as participantes que utilizaram ISRS durante a gestação, 20 o fizeram apenas durante o primeiro trimestre e 21 no primeiro ou em um ou dois trimestres a mais. Os ISRS utilizados foram: paroxetina, fluoxetina, sertralina, fluvoxamina e citalopram. Os filhos das participantes, entre as idades entre 7 e 15 anos, foram submetidos a ressonâncias magnéticas cerebrais em 3 momentos diferentes.

Os resultados mostraram que as crianças expostas aos ISRS durante a gestação apresentaram redução no volume de substância cinzenta e branca, particularmente no circuito corticolímbico, que persistiu até os 15 anos. Essa redução foi observada em várias regiões cerebrais, como o córtex frontal e o córtex cingulado. No entanto, em algumas áreas do cérebro, como a amígdala, os volumes aumentaram com o tempo, retornando aos níveis observados em crianças não expostas aos ISRS.

Os pesquisadores destacaram que as implicações clínicas dessas alterações no volume cerebral ainda não eram claras e que mais pesquisas eram necessárias para avaliar os desfechos comportamentais e psicológicos a longo prazo associados a essas mudanças.

O estudo enfatizou a complexidade da decisão de prescrever ISRS durante a gravidez, uma vez que o uso desses medicamentos é considerado geralmente seguro, mas pesquisas anteriores levantaram preocupações sobre possíveis efeitos adversos no neurodesenvolvimento das crianças. O estudo concluiu que as descobertas não devem ser interpretadas de maneira simplista para promover ou desencorajar o uso de antidepressivos durante a gravidez até que evidências adicionais sejam obtidas.


Veja também em nosso novo blog: Exposição à classe de antidepressivos ISRS é associada a redução do volume cerebral na infância – Opinião Farmacêutica (wordpress.com)

terça-feira, 19 de setembro de 2023

Por que a Dipirona, proibida em muitos países, é permitida no Brasil?

Pode até parecer estranho. Os brasileiros estão tão acostumados com a dipirona, presente sozinha (como genérico, na Novalgina e similares) ou em associações (Dorflex, Neosaldina, Lisador, etc.), que a maioria nem imagina que esta substância seja proibida nos Estados Unidos e em muitos países da Europa.

A dipirona (também conhecida como metamizol em Portugal) foi desenvolvida na Alemanha, em 1920, pelo laboratório Hoechst. Após 2 anos, ela já estava disponível comercialmente, sendo vendida nas drogarias, inclusive no Brasil, com o nome comercial Novalgina, e permaneceu sendo amplamente utilizada em todo o mundo até as décadas de 1960/70.

Nessa época, começaram a surgir estudos relacionando o uso de dipirona ao aparecimento de casos de agranulocitose.

O que é agranulocitose?
É uma alteração do sangue, caracterizada pela redução acentuada de células de defesa (granulócitos), que são subtipos específicos de um tipo de célula sanguínea, os glóbulos brancos. Os sintomas da agranulocitose incluem: dor de garganta, febre, cansaço excessivo, infecção do trato urinário, lesões boca e/ou na faringe, inflamação da gengiva.

A agranulocitose por si só não leva ao desenvolvimento de sintomas. No entanto, devido aos baixos níveis de células de defesa, a pessoa fica mais suscetível ao desenvolvimento de infecções, o que provoca o aparecimento dos sintomas, podendo ser grave e até mesmo fatal


Um estudo, publicado em 1964, calculou que a agranulocitose ocorreria em 1 a cada 127 pessoas que consumissem a aminopirina, uma substância cuja estrutura química é bem parecida à da dipirona.








                                                        Aminopirina                                                                       Dipirona



Baseando-se nessa semelhança, os autores do estudo não fizeram distinção entre as duas moléculas e assumiram que os dados obtidos para a aminopirina seriam também aplicáveis à dipirona. A partir desta e de outras evidências, o FDA (agência regulatória dos Estados Unidos), decidiu que a dipirona deveria ser retirada do mercado americano em 1977. Essa decisão foi seguida por Austrália, Japão, Reino Unido e diversos países europeus.

A partir da década de 1980, porém, começaram a surgir novas evidências sobre a segurança da dipirona:

O Estudo Boston, realizado em oito países (Israel, Alemanha, Itália, Hungria, Espanha, Bulgária e Suécia) envolvendo dados de 22,2 milhões de pessoas, obteve resultados que encontraram uma incidência de 1,1 caso de agranulocitose para cada 1 milhão de indivíduos que usaram a dipirona — considerada uma frequência muito baixa.

Em Israel, outro estudo, realizado com 390 mil indivíduos hospitalizados, calculou um risco de 0,0007% de desenvolver agranulocitose e de 0,0002% de morrer em decorrência dela.

Já na Suécia, que havia voltado atrás e liberado a dipirona brevemente nos anos 1990, foram detectados 14 casos de agranulocitose possivelmente relacionados ao tratamento, com média de 1 caso para cada 1.439 indivíduos que tomaram esse fármaco.

Essa frequência mais alta, aliás, fez com que o país voltasse a proibir sua comercialização novamente em 1999.


Qual o motivo desses resultados tão conflitantes?


Não se tem uma resposta definitiva, porém alguns fatores podem ajudar a explicar:

  • Existe uma mutação genética que parece facilitar o aparecimento da agranulocitose em alguns indivíduos que usam dipirona. E sabe-se que essa mutação é mais comum em populações dos Estados Unidos e de partes da Europa.
  • Dosagens mais altas e uso por tempo prolongado também poderiam influenciar neste risco, embora na própria bula da Novalgina conste a informação de que o aparecimento da agranulocitose "não é dose dependente e pode ocorrer em qualquer momento durante o tratamento".

E por que a dipirona é permitida no Brasil?


A dipirona foi alvo de uma grande pesquisa realizada na América Latina que ficou conhecida como Latin Study.


Entre janeiro de 2002 e dezembro de 2005, cientistas do Brasil, Argentina e México analisaram dados de 548 milhões de pessoas. Nesse universo, foram identificados 52 casos de agranulocitose, o que representa uma taxa de 0,38 caso por milhão de habitantes/ano.


Pouco antes disso, em 2001, a Anvisa realizou um evento chamado “Painel Internacional de Avaliação de Segurança da Dipirona”, em que foram convidados especialistas brasileiros e estrangeiros. Concluiu-se, deste evento, que há consenso de que a eficácia da dipirona como analgésico e antitérmico é inquestionável, e que os riscos atribuídos à sua utilização na população brasileira são baixos e similares, ou menores, que o de outros analgésicos/antitérmicos disponíveis no mercado.


Podemos concluir, portanto, que a mutação genética que pode facilitar o aparecimento da agranulocitose em algumas pessoas que usam dipirona não parece estar presente em larga escala na população brasileira, e que, pelos resultados dos estudos realizados em nossa população, a dipirona é um medicamento seguro quando utilizado dentro das doses recomendadas e respeitando-se as contra-indicações e precauções.




sábado, 2 de setembro de 2023

Tempo de mudanças...

Há momentos na vida em que as mudanças simplesmente acontecem.

O blog Opinião Farmacêutica, que existe desde 2010, está  mudando de identidade visual, e se mudando para outra plataforma: o Wordpress. O Wordpress é reconhecido por ser uma plataforma mais flexível, e que permite muito mais personalizações do que o Blogger.

A mudança será gradual. Serão escolhidos os principais posts escritos durante esses anos, que serão revisados, atualizados e então postados na nova plataforma. E isso tudo junto aos novos artigos que serão escritos!

Num primeiro momento, os novos artigos que forem postados lá serão também postados aqui, praticamente de forma simultânea. 

Portanto, gostaria de agradecer a cada um de vocês, leitores, que acessaram este blog em algum momento nos últimos 13 anos! E também gostaria de convidá-los para conhecer o novo Opinião Farmacêutica:

opiniaofarmaceutica.wordpress.com


Muito obrigado a todos!

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Medir ou aferir a pressão? Qual o termo correto, afinal?

Os termos utilizados para o ato de utilizar um instrumento que mostrará qual a pressão sanguínea de um indivíduo são causa de muita discussão entre profissionais da saúde.


Eliminando-se os termos "tirar a pressão", que é totalmente incorreto, e "verificar a pressão", pouco utilizado, ficamos com os principais: "medir a pressão" e "aferir a pressão". Estariam os dois corretos, ou um é mais adequado que o outro? É essa resposta que me proponho a discutir nesse post.

Para começar, vamos usar as definições do dicionário Aurélio para cada um dos termos:

Aferir: 1. Conferir (pesos, medidas, etc.) com os respectivos padrões. 7. Avaliar, estimar, medir.

Medir: 1. Determinar ou verificar, tendo por base uma escala fixa, a extensão, medida ou grandeza de (algo).

Como podemos ver, medir é um dos sinônimos de aferir, o que tornaria ambos corretos gramaticalmente.

Porém, tecnicamente falando, o termo aferir é utilizado com o sentido de sua definição nº1: Conferir (pesos, medidas, etc.) com os respectivos padrões. Como exemplo, quando vamos aferir uma balança, pegamos um objeto (peso) com um valor conhecido (p. ex. 1kg), e vemos se a balança mostra exatamente 1kg. Caso ela não mostre esse valor, deverá ser calibrada. Isso é aferição. Compara-se o resultado de um instrumento com um padrão.

Já a palavra medir é utilizada quando se compara o objeto da medição com uma escala de valores, utilizando-se do auxílio de instrumentos. Como medir a temperatura, usando a escala Celsius ou Fahrenheit, através de um termômetro.

Aliás, os instrumentos utilizados para se fazer medições terminam em -metro, como o próprio termômetro, o velocímetro, o altímetro, o anemômetro, o pluviômetro, o barômetro e inclusive aquele utilizado para a medição da pressão sanguínea, o esfigmomanômetro.

Então, se você mede (e não afere) temperatura, velocidade, altitude, quantidade de chuva, pressão atmosférica, etc., então nada mais óbvio do que medir a pressão sanguínea também!

No entanto, a expressão "medir a pressão" foi ridicularizada em diversos cursos da área da saúde por professores que a ouviam de seus alunos e respondiam que "para medir a pressão, deve-se usar uma fita métrica". A causa da discórdia no uso dos termos deve ter surgido da ignorância desses profissionais quanto ao verdadeiro significado do uso dessas palavras.

Resumindo: embora pelo dicionário os dois termos estejam corretos, tecnicamente o uso do termo"medir a pressão" é mais adequado.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Eparema e Epocler servem para evitar ou curar a ressaca?



Quase todo mundo sabe que Eparema e Epocler servem "para o fígado", e muitos acham que são a mesma coisa. Mas não são iguais, e a escolha entre eles dependerá de qual o problema que a pessoa tem.


Mas eles servem para evitar ou curar a ressaca?


Para respondermos, primeiro vamos ver como funciona cada um desses medicamentos:


  • EPAREMA

Composto pelos extratos vegetais de Boldo, Cáscara Sagrada e Ruibarbo. Indicado para facilitar a digestão de alimentos gordurosos através da eliminação da bile.

Para entendermos melhor, primeiro vamos falar rapidamente sobre as funções da bile (também chamada de bílis): a bile é um fluido (líquido) produzido continuamente pelo fígado, e que vai sendo armazenado numa espécie de bolsa, chamada vesícula biliar (conhecida popularmente apenas como vesícula). Quando comemos, os alimentos vão tendo uma parte da sua digestão no estômago, e depois passam para o intestino. Quando chegam lá, a vesícula libera a bile que estava armazenada, para que ela possa "quebrar" a gordura presente no alimento, o que facilita a ação de uma enzima chamada lipase, que atua na absorção da gordura.


Após uma refeição rica em gordura, podemos ficar com uma sensação de digestão difícil, pesada. É aí que entra o Eparema. Ele tem ação colagoga (aumento da produção de bile) e colerética (aumento da saída de bile da vesícula). Portanto, facilita a digestão das gorduras. 

principal ação do Eparema deve-se ao extrato de Boldo.


  • EPOCLER
Composto por Colina (citrato de colina), betaína e metionina (racemetionina). Indicado no tratamento de distúrbios metabólicos hepáticos (= do fígado), entre eles a esteatose hepática

Essa doença caracteriza-se pelo acúmulo anormal de gordura dentro das células do fígado, condição que pode se agravar e levar a uma cirrose hepática. A esteatose é causada por diversos fatores, mas um dos mais comuns é a ingestão excessiva de álcool, aguda ou crônica.

Os aminoácidos presentes na fórmula do Epocler (colina e metionina), atuam na metabolização das gorduras acumuladas no interior dos hepatócitos, com o intuito de reverter o quadro da esteatose hepática. A metionina ainda tem importante função protetora do fígado contra os radicais livres por sua ação antioxidante acentuada e por ser precursora da glutationa, um dos principais antioxidantes deste órgão. A betaína completa a ação antioxidante hepática, pois juntamente com a metionina e a colina, acelera a remoção da gordura infiltrada no fígado.


Agora, respondendo à pergunta lá de cima, se eles servem para evitar ou curar a ressaca: NÃO!

Como pudemos ver, o Eparema não tem ação alguma sobre a absorção ou o metabolismo do álcool. Já o Epocler poderia ter algum efeito ao minimizar os efeitos oxidativos dos radicais livres. Porém, segundo o dr. Hoel Sette Jr., médico hepatologista e diretor clínico da Clínica Pró-Fígado, após ser perguntado se "Depois de beber, é bom tomar remédios hepatoprotetores como Epocler e Metiocolin?":

"Tais medicamentos, vendidos sem receita médica e compostos de sais minerais, aminoácidos e vitaminas, não têm qualquer efeito protetor sobre o fígado. Para quem não quer sofrer danos advindos do álcool, só existe um conselho: beber com moderação."


sábado, 7 de junho de 2014

Por que devemos tomar antibióticos na hora certa e pelo tempo certo?




Você já deve ter ouvido de um médico que um antibiótico deve ser tomado, por exemplo, a cada 8 horas por 7 dias. Infelizmente, muitas pessoas acham que, quando já estão melhores, mesmo que ainda faltem alguns dias para o término do tratamento, podem parar de tomar o medicamento. Mas por que isso é errado?

O assunto é um pouco complexo, mas tentarei explicar de uma forma bem simplificada:

Uma infecção bacteriana acontece após entrarmos em contato com bactérias patogênicas (isto é, que podem causar doenças. A grande maioria das bactérias existentes é inofensiva). Como exemplo, podemos citar a ingestão de um alimento contaminado por "uma" bactéria. Na verdade, não é 1 bactéria, mas centenas de milhares a milhões delas. Após a ingestão, nosso organismo não consegue dar conta de eliminá-las, e elas vão se multiplicando até chegar a um número suficiente para provocar os sintomas da infecção.

Quando esses sintomas aparecem, o médico pode achar necessária a administração de um antibiótico. Dependendo do seu tipo de ação, um antibiótico pode ser bactericida (mata as bactérias) ou bacteriostático (impede seu crescimento e multiplicação).

Para exercer seu efeito de matar ou impedir o crescimento das bactérias, o antibiótico deve atingir e manter uma certa concentração no sangue por um período de tempo suficiente. Explico: após tomarmos um comprimido de antibiótico, este será absorvido através do intestino e cairá na corrente sanguínea, a partir de onde será distribuído pelo organismo. A dose deste antibiótico foi estudada para que ela atinja a concentração correta no sangue. Vamos tomar como exemplo um dos antibióticos mais usados, a Amoxicilina 500mg. Uma boa parte desses 500mg chegará ao sangue e atingirá a concentração ideal. Aos poucos, essa amoxicilina vai sendo eliminada pelo organismo, até baixar para uma concentração insuficiente para continuar matando as bactérias. Esse tempo é de aproximadamente 8 horas. Esse é o motivo pelo qual ela deve ser tomada de 8 em 8 horas.

Observe o seguinte gráfico:


























Nele, podemos observar a concentração de amoxicilina por tempo (linha vermelha) e a concentração mínima na qual ele é eficaz para matar as bactérias, chamada de Concentração Inibitória Mínima, ou C.I.M. (linha azul). Vemos que após a administração, a concentração sanguínea sobe rapidamente, e começa a cair, primeiro de maneira mais rápida, depois mais lenta. Depois de 8 horas, essa concentração passa a ficar abaixo da C.I.M., o que significa que a partir desse ponto o antibiótico deixa de ser eficaz, e as bactérias voltam a se multiplicar. Se for tomado com intervalo menor, haverá um excesso do medicamento no organismo, podendo levar ao aparecimento de efeitos tóxicos. Essa é a importância de se tomar os antibióticos no horário correto.

E por que devem ser tomados pelo número de dias correto?

Veja as seguintes figuras:



Podemos observar bactérias sensíveis (em azul), isto é, que morrem com o antibiótico, e bactérias resistentes (em vermelho), que não morrem com ele.

Na figura A, vemos uma infecção onde existem muito mais bactérias sensíveis do que resistentes. Tomando-se o antibiótico corretamente, restariam apenas umas poucas bactérias resistentes, as quais seriam facilmente eliminadas pelo próprio sistema imunológico do organismo.

Na figura B, podemos notar que, após o tratamento por um tempo mais curto do que o necessário, sobraram as bactérias resistentes e também algumas sensíveis. O problema é que essas bactérias resistentes conseguem transferir a parte do material genético que elas possuem e que confere resistência ao antibiótico para as bactérias sensíveis, que então tornam-se resistentes. Veja:





Na parte de cima da figura, à esquerda, vemos uma bactéria resistente, que possui um plasmídeo (anel duplo vermelho), que é o material genético que confere resistência ao antibiótico. À direita, uma bactéria sensível.

No meio, a bactéria resistente transfere uma cópia do seu plasmídeo à bactéria sensível, num processo chamado transferência de plasmídeo. Por fim, como mostra a parte de baixo da figura, estas duas bactérias estão resistentes ao antibiótico.

Agora, imagine isso em uma escala de centena de milhares a milhões de bactérias. Isso não afeta somente a quem tomou o antibiótico de maneira errada. Afeta também a todos os que forem infectados com as bactérias deste indivíduo, pois receberão bactérias resistentes, e o antibiótico não fará mais efeito.

E, infelizmente, isso já acontece. Muitos antibióticos estão deixando de fazer efeito graças ao uso inadequado. Daí o surgimento das chamadas superbactérias, que são resistentes a diversos antibióticos.

Então lembrem-se: sempre que tiverem que tomar antibióticos, respeitem os horários (mesmo que tenham que acordar de madrugada) e tempo de tratamento, pois isso poderá ser a diferença entre acabar com uma doença ou criar uma superbactéria!

Espero ter ajudado! Porém, como eu já disse, trata-se de um assunto complexo e muito técnico, e é muito difícil resumi-lo numa linguagem mais simples. Caso tenham dúvidas, por favor, perguntem nos comentários, que tentarei respondê-las assim que possível!

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Por quê o Soro Fisiológico tem este nome?

Se você nunca usou soro fisiológico (ou solução fisiológica) na sua vida, muito provavelmente já ouviu falar nele. De utilização extremamente comum, pode ser usado para limpeza de feridas, curativos, lentes de contato, dentre outros usos.




Mas por quê ele recebe este nome?

De acordo com a definição da Wikipédia, a palavra Fisiologia "(do grego physis = natureza, função ou funcionamento; e logos = palavra ou estudo) é o ramo da biologia que estuda as múltiplas funções mecânicasfísicas e bioquímicas nos seres vivos. De uma forma mais sintética, a fisiologia estuda o funcionamento do organismo."

Fisiológico, então, é o que refere-se à fisiologia. Então o que aquele famoso soro tem a ver com a fisiologia?

Nosso corpo é formado por aproximadamente 65-75% de água. Esta água está distribuída por todo o organismo, fazendo parte do líquido presente dentro e fora das células, do sangue, da saliva, da lágrima, entre outros. Ela não é pura: existem muitas substâncias dissolvidas nela. Uma delas, das mais importantes, é o cloreto de sódio.

Sim, o cloreto de sódio é exatamente aquele "pozinho" branco que geralmente encontramos num frasco sobre quase todas as mesas de restaurantes e lanchonetes: o sal.

Nos líquidos de nosso organismo, na maioria dos tecidos, a concentração de cloreto de sódio é de 0,9%, ou seja, 0,9g a cada 100mL Portanto, essa é a concentração para o funcionamento do corpo, portanto é a concentração fisiológica.

A composição do soro fisiológico é apenas cloreto de sódio em água, em concentração de 0,9%. Ou seja, uma concentração fisiológica. Daí o nome Soro Fisiológico!

Por esse motivo o soro tem o "sabor" parecido com o da lágrima, já que ambos têm a mesma concentração de sal. E é também por isso que ele pode ser utilizado no olho, em lentes de contato, feridas, medicamentos injetáveis...

Mas fiquem tranquilos: apesar de o cloreto de sódio ser o mesmo do sal de cozinha, o que é utilizado no soro fisiológico é de pureza de grau farmacêutico. Isto significa que é muito mais puro do que o sal comum.

E por que não usamos simplesmente água pura (destilada ou deionizada) no lugar do soro?

Porque essa água tenderia a entrar nos tecidos corporais, para diluir a concentração de sal nesses locais, processo conhecido como osmose. Isso provocaria um edema (inchaço) nesses tecidos, além de outros problemas potencialmente mais graves.




sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Diclofenaco sódico deve ser evitado por hipertensos? E o potássico?

No meu post sobre as diferenças entre os tipos de diclofenaco, pude notar, nos comentários, que existe mais um mito a respeito deste medicamento: de que o diclofenaco sódico não deve ser usado por hipertensos, devendo ser utilizado o diclofenaco potássico nestes casos.

Peço desculpas aos leigos, mas para chegar à minha conclusão, preciso apresentar alguns argumentos técnicos. Porém, farei o máximo para simplificá-los.

A massa molecular do diclofenaco sódico é aproximadamente 318. A massa atômica do sódio é 23. Então, a massa somente do sódio equivale a 7,23% da massa do diclofenaco sódico.

Um comprimido de diclofenaco sódico comum contém 50 mg desta substância. 7,23% destes 50 mg são 3,6 mg. Podemos concluir que a quantidade de sódio proveniente do diclofenaco, por comprimido, é de 3,6 mg.

A posologia usual é de 1 comprimido a cada 8 horas, o que dá 3 comprimidos por dia. Temos então 10,8 mg de sódio diários provenientes do diclofenaco dos 3 comprimidos.

A quantidade de sódio recomendada por dia deve ser de no máximo 2.300 mg, de preferência ficando abaixo de 2.000 mg. Para portadores de hipertensão (pressão alta), essa quantidade deve baixar para no máximo 1.500 mg por dia. Isso nos mostra que os 10,8 mg provenientes do diclofenaco são praticamente irrelevantes com relação ao total diário.

Então um paciente hipertenso pode tomar tranquilamente o diclofenaco sódico??? NÃO!!!

E por que não?

Porque a maioria dos anti-inflamatórios não-esteroidais (AINEs), incluídos aí os diclofenacos sódico e potássico, podem elevar a pressão arterial. Esta elevação pode ser ainda maior em pacientes hipertensos.

Conclusão: pacientes hipertensos não devem usar diclofenaco sódico nem potássico sem orientação médica, pois ambos podem provocar um aumento da pressão arterial, não pelo conteúdo de sódio, mas pela própria ação (farmacodinâmica) do diclofenaco.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Qual a diferença entre Diarreia e Disenteria (ou seria Desinteria)?

Essa é uma dúvida bastante frequente, mas não tão difícil de ser respondida.

A Diarreia é o aumento do número de evacuações, normalmente (mas não sempre) acompanhadas por fezes amolecidas (pastosas ou líquidas).

Pode ser causada por diversos fatores, como infecções por vírus, bactérias ou parasitas; medicamentos, alergias, ou ainda doenças inflamatórias intestinais.

O principal problema causado pela diarreia é a desidratação, que pode levar à morte principalmente crianças e idosos.

Já a Disenteria é uma doença inflamatória intestinal que provoca diarreia, mas sempre acompanhada por muco e sangue.

É também causada por infecções virais, bacterianas, protozoárias ou parasíticas.

Pessoas com disenteria em geral apresentam febre, tosse, cólicas intestinais e diminuição do apetite, podendo levar rapidamente à perda de peso e até à desnutrição.

E qual o correto? Disenteria ou Desinteria?

Por se tratar de uma doença (disfunção) do intestino (entérica), ou seja, disfunção entérica, o correto é Disenteria.

Então, resumindo:

Se você tiver uma diarreia, mas estiver saindo sangue e muco, é na verdade uma disenteria.

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